6 de ago. de 2011

PRENÚNCIO DA NUCA FUNDA - 17ª entrevista

Leia postagens anteriores, a começar da 1ª.
Após leitura desta, veja mais nos endereços:
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Para melhor entender as obsessões do Maluco, convém iniciar pela leitura da 1ª entrevista, de Jan 2010.
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De  julho 2010
À noitinha, nas proximidades da universidade, um casal de estudantes encontra o maluco Pão Doce na esquina da praça. Estava circunspecto.
Ainda faltavam no entorno de quarenta minutos para início das aulas. Então, para consumir o tempo divertindo-se, o rapaz aproveita a oportunidade. Toma a moça de um braço, aproximam-se sorrindo. O moço provoca ...

— Oi bicho... tudo bem?
Melhor seria se a mim se dirigisse em termos respeitosos. 
— Tem razão, Pão Doce... Perdoe-me a intimidade. Mas veja lá: dizem  que os piores inimigos são os que foram nossos mais chegados. Que nos diz do motivo?
— Meu caro eleitor subornável, tudo bem por compreender os impulsos da sua idade. Respondo à provocação, ainda que a pergunta seja por demais batida. Em todo caso, o saber sobre alguns temas se perpetua pela repetição verbal entre sucessivas gerações.
A traição de amigos pode originar-se por várias causas. Uma pode vir da má interpretação sobre alguma atitude do traído. Outra, pelo simples despeito que o traidor porta em relação às virtudes da vítima. Ainda outra, pelo mórbido prazer de trair aleatoriamente. E outro motivo de traição pode se dar de modo planejado por alguma organização manipuladora, interessada em destruir determinado indivíduo sob patrulhamento. De modo que, por meio do enxerto da falsa amizade, interpretada por esbirros da confraria, essa consegue inteirar-se do que o patrulhado esteja pensando e de seus planos de vida. Com tais informações são facilitadas as iniciativas de emparedamento à vítima.
Digo ao jovem casal: assim como tudo tem evoluído, ora para o bem, ora para o mal, até o vínculo das amizades, nos dias atuais, devem ser analisados, caso a caso. De modo geral, enfatizo: nestes tempos, nas classes sociais de média-alta a alta, as amizades estão mais vinculadas a recíprocos interesses monetários, privilégios apoio e poder, do que à razão de valores pessoais, éticos.
Entretanto, ainda que às vezes possamos incorrer em erros de cálculo, mesmo assim, vale a pena apostar em amigos que nos pareçam de índole sincera e firme.
Por demais, meus caros admiradores, se alguém que vocês consideravam amigo os traiu, ainda assim vocês estão no lucro: o traidor agiu gratuitamente. Porque há os que podem cobrar altos honorários para lhes fazer o mesmo.
— Então, Pão Doce, no seu conceito negativista, até as amizades representam buracos a merecer atenção?
— Éhh... é um tanto assim, um tanto não, m’amigo! A coisa é mais ou menos como dá a entender meu colega, o sábio Boli-Boli de Caicó:  importante é o buraco... o resto é só beirada...

Há poucos minutos, mais três universitários se juntaram ao casal para a mesma diversão. Por um tempo, apenas ouvem. Logo um embarca na gozação...

— Pão Doce, quanto a instituições infestadas de perversos, que de repente passam a clamar pela imediata paz local ou mundial... que nos diz?
— Caro eleitor... É hilário!  Recordo-me dessas... dessas, de passado autoritário, perseguidoras, criminosas; dessas que sempre deram uma no cravo e três ou quatro na ferradura. Exímias atrizes de multifaces. Porém, quando percebendo a própria decadência, ante o agigantamento da força e terror de suas anteriores vítimas defenestradas... de fato, é assemelhado ao que você disse: em ridículos rogos estão sempre pedindo paz.
Em suma, propõem: quem sem culpa morreu, morreu; quem, nas mesmas condições, foi destruído amargue o peso da tirania. Enfim, as vítimas, que ainda possam estar vivas que se danem na desgraça. Às referidas instituições o que importa é a saída da fase decadente, de modo a facilitar a reorganização e retorno ao velho estilo, assim que surjam chances.
Mas pode-se perceber que, na proposta de paz e  esquecimento que apresentam, a essência sempre emerge clara: esqueçamos todo bem que me fizeste, todo mal que te fiz, com o tácito direito de prosseguir em minha natureza de sanhas e assédios, assim que se me abram oportunidades.
É isso, m’amigo!

Mais outros pequenos grupos vão engrossando a roda. O maluco, como sempre, vai se empolgando com o ainda pequeno mas aumentado número dos  que o rodeiam.
Uma universitária do curso de ciências políticas também aproveita para extrair mais pândegas do infeliz ...

— Pão Doce... qual a diferença de objetivos da política e das religiões?
— Prezada universitária de beleza e corpo exuberantes, mas ainda em fase de absorver conhecimentos... Diferença de objetivos não há. Ambas perseguem os mesmos fins: fortuna e poder político – porque aquela facilita o outro, e vice-versa. O círculo se completa.
A política simples, constituída de partidos, age com base em correntes de opinião diversificadas, ainda que essa aparência possa ser, propositadamente e apenas, máscara.
Mas a política religiosa é de partido único conforme olhos atentos podem constatar. E além de idéias totalitárias, é política potencializada.
— Potencializada? Usa a matemática?
        — Prestimosa... quiçá minha futura conselheira, por mim em breve nomeada, para assuntos íntimos e particulares, na pátria que governaremos. Mas, por questão de critérios de minha política de avaliação, antes de nomeá-la, daremos uma volta de metrô lotado, para testar sua serenidade nos momentos de aperto. A senhorita poderá marcar data para a prova, desde que o evento se dê em horas de mais elevada lotação nos vagões. É do meu estilo de governo!
Mas volto ao esclarecimento sobre essa política potencializada das religiões, sem uso da matemática, mas da psicologia aplicada sobre as populações ignaras. Vou às fases do malicioso artifício. Primeiro, crie-se um mito, um fantasma, ou algo assemelhado.
Atribua-se a esse mito poderes imensuráveis, com temperamento, ora consolador, ora mesclado com ímpetos de terror e severos castigos.
Para assegurar a perenidade, unanimidade de culto e apoio irrestrito ao fantasma,  e a sua organização humana, dê-lhe face de extrema violência contra os que nele não creiam – conforme já me referi em discursos ao vulgo de outras plagas.
Criado o mito e seu perfil, denomine-o deus, um deus absoluto, criador e dono de tudo, que tudo vê, que tudo sabe. Mas que a ele  possam ser atribuídas variações de caráter, a fim de contentar as diversas correntes dos sedentos de fantasias mentais, conforme a fragilidade psicológica congênita, e da ignorância, de cada povo das regiões do Planeta.
Agora vem a fase mais intensa para o sucesso do partido único, potencializado, sob patronato do deus criado. É a fase de indução da crença no fantástico, por meio de lendas e estorinhas, dando-lhes feições de realidades.
Essa é a fase de inoculação da esquizofrenia induzida por assédios perpétuos sobre as massas, sob a suave denominação de pescaria de almas, ou evangelização.  
Saibam que sobre isso, também, já me referi em discursos anteriores.
Por fim, conseguido o alastramento do mito, então, vem a fase essencial para o êxito absoluto: a condução de cada indivíduo à condição de fanático guerreiro do deus criado. 
Nenhum mito sobrevive sem adoração, sem o rico dinheirinho dos ingênuos, sem a mórbida loucura dos que foram levados à morbidez do fanatismo – e do cinismo de seus charlatães arrecadadores. 
Atingido esse derradeiro estágio... SUCESSO! É correr para o abraço!  Pura alegria! ehehehhh ... Agora é só manipular as massas fanatizadas, colher fortunas e poderes políticos muito mais... mas muito mais consistentes, superiores ao poder adversário sustentado em simples bases partidárias, conforme a tradição decorrente da Revolução Francesa..
Todavia, enquanto não se tenha a certeza de assalto bem sucedido contra o poder político supremo, com apoio das massas manipuladas, convém o partido mítico permanecer na condição de mero coadjuvante dos demais: democráticos, ou ditatoriais não-religiosos encimados, conforme tem acontecido.
Agora a senhorinha percebeu o que é política potencializada por mitos?
— Deu para ter uma idéia dessas suas concepções, Pão Doce. Mas não entendi sobre a pátria que governaremos, com sua exigência de prévio passeio comigo, num metrô lotado.
— Senhorinha, com esse seu corpinho de tanajura, sob minha inspiração com certeza irá sentir sua visível vocação às ciências da minha política, a ser exercida na pátria dos meus encantos. É do meu estilo de governo!

A este estágio de açulamentos à deficiência mental do pobre vivente, o coitado, como sempre, já inicia ver, no pequeno grupo, imensa multidão preenchendo a pracinha e vielas adjacentes, para ouvi-lo.
Agora um professor de biologia humana, de bigode,  barbicha, calça rancheira e camiseta, disfarçando-se de estudante, atiça ...
— Pão Doce, como poderemos diagnosticar, com precisão, o envelhecimento das pessoas?
— Bem sei de quem se trata sua ilustríssima pessoa! Bem relevo seu malicioso disfarce para esta oportunidade de  enriquecer ainda mais seus conhecimentos, a fim de transmiti-los aos discípulos por décadas a fio.
O acerto de sua pergunta se faz ainda mais relevante quando formulada diante desta imensa multidão, todos já de lágrimas nos olhos, tremendo os beiços, ao ouvirem este prodigioso charlatão que os emociona e explora.
Mas... digno mestre... antes, apenas um aplainar de conceito terminológico: o que vocês, os cientistas, chamam de envelhecimento, eu, arauto de nomenclaturas mais requintadas, chamo de a terceira afirmativa do meu antigo discípulo, Lavoisier, bom jovem que muito frutificou após o que comigo aprendeu. Quando esse menino disse que tudo se transforma, baseou-se no que eu lhe dissera sobre a inevitável fase de desmanche dos humanos.
Mestre, preste atenção: nota-se a entrada nessa fase quando, por denúncia das pernas, vai surgindo a idéia fixa em veículos de câmbio automático; as obturações dentárias vão se despregando sem motivo; o sexo vai sendo visto como entrave ao espírito; a megera angustiada transmite sua experiência às noras, de que chifrar o marido é pecado e traz remorsos; e quando a preocupação maior vai sendo a de encaixar a alma  nas arquibancadas do céu... tudo seguido de outros sintomas de senilidade.  
Mas o maior indicativo da fase aguda do desmanche é o “Prenúncio da Nuca Funda”.
— Nossa minha ! Pão Doce do céu! Que prenúncio é esse?
— Elementar, caro mestre! Todos temos o pescoço um tanto arredondado. Não é assim? Pois bem... quando as carnes laterais à nuca vão murchando, os ossos inferiores do crânio, junto à nuca, vão se tornando proeminentes... m’amigo... a situação é crítica!.
Para adiantar o expediente, convém a família procurar uma funerária agricultora de mão praguejada, para fins de orçamento e preparação do inoxorável.

Outra universitária, um tanto pasma...

— Que estória é essa de funerária agricultora de mão praguejada? Nunca ouvi notícia de especialidade fúnebre assim...
— Prezada universitária, futura executiva do Ministério do Incontornável da pátria que governaremos, por mim designada após passeio em metrô lotado com a senhorinha também... Convém que já fique sabendo dessa imutável exigência política, por mim ditada.
Em realidade, todas as funerárias são agricultoras de mão praguejada, mi’amiga! Plantam defuntos perpetuamente, sem que nasça um.
Contudo, o mais importante é o auto-exame para diagnosticar o surgimento do prenúncio.
Portanto toda essa multidão, que aqui - nesta gigantesca praça e avenidas - se comprime ansiosa de meus ensinamentos... a todos os tantos bilhões de eleitores que me assistem pelas  TVs e Internet; que me ouvem pelos milhares de rádios em todo o mundo, e depositam ofertas em minhas contas bancárias... - anote com atenção: pelas manhãs, antes de se levantarem, apalpem criteriosamente as laterais da nuca... examinem o grau de decadência das carnes laterais e saliências ósseas das imediações!
E como aprendizado façamos o primeiro exame, neste momento solene. Todos, todos... apalpem a própria nuca, e constatem o estágio de vida em que se encontram.
E quanto às admiradoras interessadas em ser por mim nomeadas aos ministérios da pátria que governarei, deixem o exame de suas nucas à minha incumbência, durante as voltinhas que daremos em metrô lotado.
E você... coroa!  que está me vendo por computador... Angustiado? Já portador do Prenúncio da Nuca Funda, n’é! Não tem arrego, meu!  hehehhh... ....  

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